Síndrome de Asperger Associada ao Transtorno Opositivo Desafiador

O texto a seguir é a tradução de trechos do livro “The Asperger Plus ChildHow to Identify and Help Children with Asperger Syndrome and Seven Common Co-Existing Conditions* [*Bipolar Disorder, Nonverbal Learning Disability, Obsessive Compulsive Disorder, Oppositional Defiance Disorder, High-Functioning Autism, Tourette’s Syndrome, and Attention Deficit Disorder]”¹, de George T. Lynn com colaboração de Joanne Barrie Lynn.

¹Título do livro traduzido: “A Criança Asperger Plus – Como Identificar e Ajudar Crianças com Síndrome de Asperger e Sete Outras Condições Comumente Co-Existentes* [*Transtorno Bipolar, Transtorno de Aprendizagem Não-Verbal, Transtorno Obsessivo Compulsivo, Transtorno Opositivo Desafiador, Autismo de Alto-Funcionamento, Síndrome de Tourette e Transtorno do Déficit de Atenção]”

 

Sobre o autor:

George T Lynn, MA, MPA, LMHC, PLLC, Counselor in Bellevue George T. Lynn é um profissional de aconselhamento de saúde mental licenciado no Estado de Washington, Estados Unidos, tendo sua prática clínica localizada na cidade de Bellevue (próxima a Seattle). Ele é pinheiro do uso de métodos psicoterapêuticos para crianças e adultos diagnosticados com síndrome de Asperger, autismo e outras condições neuropsiquiátricas. É autor de três livros populares sobre como criar filhos com diferenças atencionais e já participou de diversos programas e rádio e televisão para falar sobre seu trabalho e publicações.

 

Introdução e Considerações Sobre o Texto a Seguir

Por Audrey Bueno

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O texto traz perspectivas terapêuticas para além das dificuldades neurológicas comumente estudadas em pessoas neurodiversas, lembrando que são pessoas em primeiro lugar, e não diagnósticos ambulantes. O autor traz uma mensagem de esperança e propõe um olhar além do óbvio, fazendo colocações importantes e interessantes para quadros de comportamentos opositivo-desafiadores.

Embora o autor não tenha feito menção ao fator medicação no texto, ao chamar a atenção para a necessidade do controle da ansiedade nesses indivíduos, é importante destacar que, muitas  vezes, em casos de alta ansiedade, reduzi-la só será realmente possível com apoio medicamentoso, através de acompanhamento com um psiquiatra. Sendo possível a adesão conjunta à psicoterapia, as chances de regulação da ansiedade e aprendizado de estratégias comportamentais para lidar com esse tipo de problema aumentam exponencialmente (a linha da psicologia conhecida como “comportamental” costuma ser eficaz e tem sido amplamente recomendada para crianças no espectro do autismo ou com problemas tais como no perfil opositor, rígido e ansioso, mas não é necessariamente a única linha de escolha ou de sucesso. Outras linhas da psicologia, como a humanista ou junguiana, podem ser boas opções psicoterapêuticas, exceto pela psicanálise, que não costuma ser adequada para os problemas encontrados no espectro do autismo).

Na última parte do texto, o autor deixa uma mensagem de esperança, lembrando os pontos positivos que certas características de crianças com perfil opositor possuem e convidando os cuidadores dessas crianças a engajarem na tarefa de ajuda-las a transcender um estado negativo para um positivo, onde tenham a oportunidade de utilizar todo o potencial que possuem. Eu apenas complementaria essa parte do texto propondo um olhar para o estado emocional e psicológico desses pais, pois muito se fala do quanto a criança precisa de ajuda, mas pouco se fala sobre o quanto os pais também precisam de apoio. Suas necessidades e limitações pessoais raramente são lembradas e, em vez disso, são constantemente cobrados para que sejam fortes e estejam sempre no batalhão de frente da luta, enquanto a exaustão e desesperança devido aos anos de desgaste já se fazem presentes. Pais de crianças com esse perfil vivem em constante estado de frustração e desespero, pois veem seus esforços continuamente sendo atirados pela janela por filhos cronicamente arredios e agressivos.

É importante que esses pais saibam que empenhar-se não significa conseguir todos os dias, afinal, dependem de um outro – o filho – que toma suas próprias decisões e que muitas vezes ignora quaisquer ofertas de ajuda. Pais de crianças com transtornos do comportamento são, quase sempre, injustamente culpados pelas ações disruptivas dos filhos, sendo acusados das mais diversas formas por uma sociedade que desconhece a verdadeira realidade da situação, o que apenas reforça o sentimento de solidão, desamparo e desânimo que sentem. Assim, é importante observar que esses pais não devem se sentir culpados pelas ações dos filhos que fujam ao controle deles uma vez que tenham feito o seu melhor, dentro das limitações que todos nós, seres humanos, possuímos, que se tornam ainda maiores em situações de vida adversas, além do fato de que jamais será possível a um ser humano controlar a ação de outra pessoa. O máximo que pais que amam seus filhos podem fazer é tentar não desistir de orientá-los, procurar demonstrar de alguma forma que os amam e acolhê-los, na medida do que lhes for humanamente possível, pois, em relações desgastantes como essas, os pais adoecem também. Porém, uma coisa é certa: por mais que certos filhos se oponham e pareçam não ouvir uma palavra sequer do que lhes seja dito, tenham certeza, pais, de que eles ouvem, sim. Podem não registrar tudo, mas alguma coisa certamente ficará.

E lembrem-se: o exemplo é um professor poderoso e vale mais que muitas palavras.

 


Tradução: Audrey Bueno

 

Trechos do capítulo 5 – p. 139-143

Uma Vontade Rígida, um Espírito Poderoso: Síndrome de Asperger Associada ao Transtorno Opositivo Desafiador

A oposição é parte do plano da natureza para autoproteção durante o processo de desenvolvimento. Para que a criança cresça, ela precisa se diferenciar dos pais e outros adultos em sua vida para formar uma base sólida para o desenvolvimento futuro. Por exemplo, uma criança neurotípica passa por uma fase de crescimento de “dizer não” (os “terrible twos”) que começam antes dos 2 anos e podem se estender por vários anos até que a criança se sinta forte o suficiente quanto ao próprio ‘eu’ para começar a permitir o “sim” de vez em quando. O exercício de “dizer não” ajuda a criança a desenvolver um senso de si mesma como pessoa distinta dos pais. Este é um requerimento para o desenvolvimento de sua personalidade.

Algumas crianças não fazem a transição da oposição reflexiva de seus dias de pré-escola. Elas cronicamente recusam colaborar com os pedidos ou ordens dos pais e apenas relutantemente obedecem na escola. Elas não fazem lições de casa ou outras tarefas, e até mesmo recusam-se a ir para a escola.  Se forçadas pelos pais, elas terão ataques de birra, crises nervosas. Elas não ouvem a razão ou demonstram preocupação sobre as consequências positivas ou negativas de seus atos.

Crianças com autismo e Asperger são notoriamente opositoras. Eu tenho visto exemplos de sua vontade e força muitas vezes. Tal é um dos casos o de Bill, um adolescente com quem trabalhei em minha prática clínica acerca da oposicionalidade. Seus pais me contaram que quando Bill tinha 2 anos de idade, eles tentaram fazer com que se comportasse ameaçando a retirada de seu brinquedo favorito. Eles disseram que Bill pensou no que disseram por um minuto e então foi ao seu quarto e começou a trazer seus brinquedos, um a um, dando-os aos pais, de modo que não pudessem usar esse recurso como punição.

Minha percepção da causa principal dessa oposicionalidade é o estilo perceptual único da criança. […] Essa tendência a fixar num aspecto do ambiente ou num tópico ou numa tarefa, às custas de ver a relação dessa figura com todo o resto, molda a personalidade e caráter da criança desde uma idade muito precoce. E isso torna a vida dessa criança infernal porque a priva da habilidade de ter uma resposta emocional flexível aos outros. Não tendo tal habilidade, a criança se torna vítima de todo e qualquer estímulo do ambiente [grifo do tradutor]. Para complicar ainda mais as coisas, ela pode ser ultrassensível à estimulação. Essa hipersensibilidade a torna reativa aos pais muito além da proporção do problema real do momento. O resultado é paranoia leve e a inabilidade em ver o próprio papel no problema conjuntamente com a raiva como comportamento reflexo.

Oposicionalidade não é uma característica de identificação da SA (Síndrome de Asperger) ou AAF (Autismo de Alto Funcionamento) porque muitos indivíduos, incluindo neurotípicos e os com TDA (Transtorno do Déficit de Atenção), mostram características desse tipo de comportamento reflexo. Minha experiência clínica é de que a maioria das crianças com AAF e SA são oposicionais. Acredito que isso é assim por que essas crianças tendem a ser altamente ansiosas. Sugiro que seja a alta ansiedade, e não “ser Asperger”, a causa mais frequente da oposição severa. Resultante dessa observação está a consideração de que controlar a ansiedade da criança possa ser a chave para reduzir seu comportamento opositor [grifo do tradutor].

 

A Relação Entre Ansiedade e Oposição

A criança deixada na posição do “não dito” não tem nem a prática em tomada de decisão independente, nem a autoestima necessária para formar um senso de si mesma. Pesquisas recentes mostram que ter um senso coerente de “eu” – ou seja, uma boa resposta às perguntas “Quem sou eu? Quem são os outros?” e “O que estamos fazendo juntos?” – é essencial para um desenvolvimento neurológico saudável. Sem esse senso de si mesma, a criança se sente como ‘ninguém’. Como resultado, ela se torna altamente ansiosa.

Crianças ansiosas sofrem enormemente. Elas experimentam medo crônico de que algo ruim vá acontecer caso arrisquem qualquer novo comportamento. Elas tendem a ser tão hipersensíveis à estimulação que experimentam o mundo como sendo continuamente irritante, continuamente ameaçador. Elas estão cronicamente no limite.

A raiz latina para a palavra ansiedade é “angere”, que é a raiz da palavra “anger” (raiva, em inglês). Também significa “ser perturbado” e “pressionar firmemente”. Esta é uma descrição apropriada, pois a ansiedade é sentida como sendo uma pressão insuportável na mente, um pavor de algo sem nome e horrível, e isso pode se mostrar na raiva desenfreada da criança. As sensações corporais que acompanham a emoção são tão insuportáveis quanto a consternação mental: respiração rasa, náusea, tremor, sudorese, pulsação rápida e boca seca.

Crianças ansiosas são ‘preocupadas perfeccionistas’. Elas têm problemas em se separarem de seus pais quando chega a época para tal transição. Crianças com esses sintomas e comportamentos geralmente recebem o diagnóstico do DSM-IV de transtorno de ansiedade generalizada (TAG). Estas são as crianças que têm medo de ir para a escola ou receber amigos para dormirem em casa. Certas palavras as aborrecem. Elas têm obsessão contra germes.

Muitas crianças ansiosas expressam sua ansiedade sendo cronicamente opositoras. Pais e professores geralmente acreditam que crianças opositoras estão em “lutas de poder” com eles – acreditam que essas crianças tenham organizado uma estratégia para manipulá-los. Na realidade, se a ansiedade for a causa da oposição, tais crianças não serão motivadas por um desejo de ganhar poder sobre os cuidadores. Mais precisamente, elas estarão motivadas por uma ansiedade poderosa relacionada à sua ineficiência no mundo. Elas se sentem como “ninguéns” e não dispõem do “senso de si mesmo enquanto origem” necessário para que se caminhe de forma confiante e positiva pela vida. [A dificuldade na formação da consciência de si mesmo depende, entre outras coisas, da Teoria da Mente, prejudicada no autismo, ou seja, pessoas no espectro autista têm mais dificuldade em estabelecer sua autoimagem e senso de “self”; nota do tradutor.]

[…] a pesquisa do Dr. Siegel sobre o desenvolvimento cerebral e relacionamentos mostra que se uma criança não tem um senso coerente de si mesma, ela terá dificuldade com “flexibilidade de resposta”. Em termos práticos, ela não saberá como reagir às demandas postas sobre ela e, portanto, regredirá ao seu “modo de funcionamento padrão” da primeira infância: “Quando em dúvida, diga ‘Não!’ “

O Dr. Siegel sugere que a falta de comunicação entre os hemisférios direito e esquerdo do cérebro possam causar uma falta do que ele chama de “visão da mente”² , ou a habilidade de entender a perspectiva e intenção do outro. Esse tipo de “estruturação cerebral” resulta em falta de empatia e dificuldade em ler os significados não-verbais dos outros e em regular estados emocionais pessoais.  Uma característica central tanto de pessoas com SA quanto com AAF é a falta da teoria da mente dos outros. Isso significa que pessoas com SA ou AAF não entendem as motivações dos outros “intuitivamente” através da observação de suas ações, palavras e comportamento não-verbal. [² Muitos estudiosos se referem a isso como “Teoria da Mente”; nota do tradutor.]

[…]

O Dr. Gabor Maté, que tem TDA e escreveu um livro popular sobre o assunto intitulado “Scattered” (“Desordenado, Espalhado por Todos os Lados”), desenvolve sua análise a partir do pensamento do Dr. Gordon Neufeld, um psicólogo desenvolvimental de Vancouver, Canadá. O Dr. Maté sugere que para decrescer a oposicionalidade, é preciso construir um relacionamento com a criança e treiná-la para tomar suas próprias decisões. Maté cita a pesquisa de Neufeld para propor um termo para o tipo de oposicionalidade que mais frequentemente se vê em crianças com TDA e outros diagnósticos neurológicos – “contravontade”. Tomando uma frase do trabalho de Siegel, Maté sugere que não é a presença de uma forte vontade que torna a criança opositora, e sim a falta de habilidade em ter qualquer vontade de fato. Então a criança a substitui por uma reatividade automática para qualquer demanda posta sobre ela.  Educação, e não punição, é o caminho para reduzir a oposição. A criança se torna menos oposicional à medida em que aprende formas de se sentir menos ansiosa e mais presente em sua vida.

Como terapeuta trabalhando com crianças opositoras, aprendi a por de lado os registros médicos e diagnósticos e tentar entrar num diálogo sobre suas vidas e sobre o que elas fazem para satisfazer suas necessidades. Há uma razão pela qual as crianças fazem o que fazem, e essa razão não é sempre imediatamente evidente para os adultos. Ao contar sua história, eu aprendo, por exemplo, o quão eficiente a oposição é em proteger a criança das expectativas dos adultos ou, ainda, como essa oposição protege a criança de ter que lidar com o fato de que ela não consegue cumprir com o que as outras pessoas requisitam dela.

[…]

Numa observação mais extensa, há denominadores comuns de gênio positivo na maioria das crianças com Asperger & TOD3 . Elas são ferozmente independentes. São corajosas. Muitas demonstram inteligência superior. A maioria tem um lado bondoso, compadecido, geralmente expresso em cuidar de crianças pequenas ou animais. Além disso, podem ter um forte senso pessoal de justiça. Essas qualidades podem ser as sementes da contribuição da criança para o mundo. Elas podem aproveitar tais qualidades se conseguirem aplacar a poderosa ansiedade que se expressa em sua oposição. Nossa tarefa é ajudá-las a transcenderem suas posições de vida de desfavorecidas reativas, ou crônicas fora-da-lei, para que esse potencial de caráter possa emergir.

3 TOD – Transtorno Opositivo Desafiador

7 comentários sobre “Síndrome de Asperger Associada ao Transtorno Opositivo Desafiador

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  2. Gostei demais desta publicação. Mas fiquei com uma dúvida. Como diferenciar se um comportamento opositor e reflexo do TEA ou se é a combinação dos dois, TEA/TDO?

    • Olá, Nadejda. Obrigada pelo comentário. Respondendo à sua pergunta, um primeiro ponto na diferenciação do que é típico do TEA e o que já passa a configurar TOD (Transtorno Opositivo Desafiador) é a INTENSIDADE do comportamento. Sei que essa análise é um tanto quanto subjetiva (mas análises de quadros mentais nunca são um fórmula exata), mas digamos que seja mais ou menos assim: de 0 a 10 no quesito oposição, sendo 0 equivalente a “nada opositor” e “10” extremamente opositor, poderíamos imaginar que crianças típicas estariam na faixa de 1 a 4, crianças com TEA estariam na faixa de 4 a 7 e crianças com transtorno opositor estariam na faixa entre 7 e 10. Note que esta é apenas uma ideia geral, e esses números não existem no diagnóstico clínico, sendo apenas ilustrativos da intensidade da qual falei. Além disso, uma criança com um nível de intensidade opositora 4 teria comportamentos muito parecidos com uma criança com TEA e TOD de nível 4. Assim, falando apenas do comportamento relacionado ao TOD, este seria muito parecido em ambas, e a criança com TEA teria adicionalmente os outros traços de TEA além da oposição. Vale ressaltar que nem todas as crianças com TEA são assim opositoras. Existem aquelas bastante calmas e até apáticas. Porém, existem algumas características que crianças com TEA não apresentam e que se houver um Transtorno Opositor associado elas passam a apresentar, que é o ato de deliberadamente (intencional e gratuitamente) provocar o outro. Crianças com TEA geralmente se opõem quando se sentem ameaçadas (o “não” que o adulto diz pode representar ameaça), e não como se fosse por “prazer”, ou seja, as primeiras se opõem para se defender e as segundas por terem um certo ‘gosto’ em atacar. Crianças com TOD também são mais vingativas e põem a culpa de seus erros nos outros com mais frequência. Por fim, o TOD não costuma ser diagnosticado antes do 6 anos, embora desde os 4 a criança já possa apresentar todos os sintomas. O TOD pode ser melhorado significativamente com medicação para controle da agressividade. Terapia psicológica pode ajudar, mas nem sempre, e não geralmente sozinha, ou seja, sem que haja apoio medicamentoso. Talvez você queira ler mais sobre isso nesse post: https://sindromedeasperger.blog/2018/01/16/comorbidades-mais-frequentes-em-asperger-uma-visao-geral/
      Abraço!

  3. Meu marido teve diagnóstico de TEA e TDAH aos 43 anos. Toma Venvanse e Lamotrigina. Nunca fez terapia e tem TOD acentuado. É muito ansioso. Nosso relacionamento é difícil e gostaria de ajuda de como lidar com TOD. OBRIGADA!

    • Olá! Nem sempre é fácil delimitar a linha que divide o comportamento opositor que já existe comumente no TEA de alto funcionamento do comportamento opositor “a mais”, que configuraria o TOD como comorbidade. Por isso, minha primeira sugestão seria pesquisar e procurar conhecer o máximo possível de informação sobre a síndrome de Asperger, e não somente sobre o TOD separadamente, pois quando a pessoa já tem um diagnóstico de TEA, as principais dificuldades que ela enfrenta e que geram seu comportamento são as relativas ao autismo, sendo o TOD um “efeito colateral” dessas dificuldades. Você mencionou a ansiedade e esse é realmente um dos problemas centrais tanto no TEA quanto no TOD. Talvez seja preciso aumentar a Lamotrigina ou mesmo tentar alguma outra medicação, se esta não estiver ajudando muito, sempre com foco na redução da ansiedade, pois quando a ansiedade melhora, tudo tende a melhorar também. Seu marido provavelmente passou toda uma vida tendo que ser quem não é, tendo que lidar com coisas que são difíceis para ele, tendo que coexistir num mundo neurotípico que não respeita, reconhece ou entende as limitações e necessidades especiais dele, e isso certamente ampliou a ansiedade e resposta defensiva (expressa pelo TOD), quase como se ele tivesse uma espécie de Stress Pós-Traumático parecida com combatentes de guerra, que é o que acontece com muitos portadores de Asperger que tiveram que “se virar na vida” sem qualquer apoio específico para sua condição. A compreensão do quadro Asperger talvez seja a maior das chances de que você encontre meios de melhorar a convivência com ele. Um bom terapeuta, caso ele tivesse interesse ou disposição para isso, poderia ajudar, mas ele teria que estar disposto a procurar, pois precisaria ser alguém que entendesse ao menos minimamente do quadro de Asperger, algo ainda muito raro na realidade clínica dos profissionais de psicologia no nosso país, de modo que ele poderia ter que acabar passando por vários profissionais até dar certo com um. No entanto, um terapeuta com boa postura profissional (neutro, não invasivo) e boa capacidade de percepção já poderia, eventualmente, ser de grande ajuda. Mas isso é algo que ele pode não ter abertura para buscar e se não tiver, não se deve insistir jamais. Muitas pessoas com autismo não conseguem ter essa abertura para psicoterapia, mesmo porque falar de si de forma autorreflexiva é uma árdua tarefa para autistas. Mas, independentemente disso, o simples fato de você passar a conhecer a síndrome de Asperger com mais profundidade já poderá ajudar bastante o relacionamento de vocês, o seu marido indiretamente e a você também, à medida em que a compreensão ajude a suavizar a mágoa que acaba se instalando no coração do parceiro de alguém com TEA (especialmente se o parceiro não tiver autismo, o que é comum), por não compreender suas atitudes e achar que tudo tem a ver com falta de amor ou consideração, o que não é verdade. Esse blog reúne vasta informação sobre Asperger, com fontes de qualidade, de modo que talvez você encontre a maior parte da informação que precisa aqui. Deixo a seguir os links de três textos em especial. Boa sorte. Seja sempre bem-vinda ao blog.
      https://sindromedeasperger.blog/2018/01/16/comorbidades-mais-frequentes-em-asperger-uma-visao-geral/
      https://sindromedeasperger.blog/2017/11/24/teoria-da-mente-tom/
      https://sindromedeasperger.blog/2018/06/12/problemas-no-padrao-de-pensamento-da-pessoa-com-a-sindrome-de-asperger/
      https://sindromedeasperger.blog/2017/10/02/o-lado-negativo-da-sindrome-de-asperger-para-os-homens/

      • Obrigada pela resposta. Realmente é muito difícil encontrar profissionais de psicologia que estejam acostumados com essas síndromes principalmente em adultos. Ele é refratário a qq terapia e tem muita dificuldade em autoaceitação. Eu faço terapia para poder dar conta de toda dificuldade que existe no nosso relacionamento. Mais uma vez obrigada de verdade!

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